FOLIA DE REIS
De Gildázio Vieiragilvisan@sunrise.ch
Sempre me recordo os acontecimentos da minha infância e adolescência lá no meu Sertão longínquo, dentre essas recordações, a Folia de Reis. O ano demorava a passar, parecia 10 em 1, e quando chegava 31 de dezembro, meus irmãos e eu não dormíamos, ficávamos esperando dar meia noite, era a chegada de Miguel Tamangano e sua família para cantar o “reis”; primeiro na Igreja da nossa querida Santa Luzia, depois na casa do meu pai (ele tinha uma promessa de dar 10 cruzeiros ao primeiro “reiseiro” do ano.)
Era só alegria, acompanhávamos os “reseiros” e em cada casa a linda cantiga folclórica: “Por aqui “lá vai” chegando os 3 reis do Oriente, “vai” chegando e vai dizendo ó de casa nobre gente” depois as gaitas e o zabumba, que maravilha! Como era bonito! Miúdo no zabumba era “os exemplos,” bom demais, e na hora do samba ele repicava seu instrumento que até dava reboliços nas entranhas, meu irmão Gilvan, o 5° pela ordem de nascimento, era fã n° 1 do Miúdo, sempre ao seu lado, seguia-o todo o dia, nem comia.
Mas, em abril (o ano só Deus sabe) para a tristeza do Gilvan, Miúdo foi para São Paulo. Ele sempre comentava: “Será que Miúdo vai estar aqui no fim do ano? Sem ele não tem graça os “reiseiros”, nem vou ver, vou é dormir”. Era mesmo seu admirador.
Os Campos, dentre os povoados de Sebastião Laranjeiras é o mais festivo, de pessoas inteligentes e lugar de artistas, minha mãe nasceu lá, espero ter sido agraciado com alguns genes campistas. Pois é, uma linda noite o forró comia solto na casa do Sr. José Silva, grande sanfoneiro! E nesse dia à tardinha, de surpresa tinha chegado o Miúdo, depois de ter passado 4 meses no sul; foi logo visto frente à casa debaixo de um umbuzeiro sentado num carro de boi, de óculos escuros, no bolso da camisa um pente, uma escova de dente e no bolsinho da calça um espelho que ele sempre o olhava para ajeitar os cabelos e mostrar a foto de uma mulher pelada no verso, mostrava discretamente, claro; 4 meses fora e não reconhecia ninguém, sempre perguntava algo como, quem era o pai, etc., para ajudar a sua memória e falando difícil, carregando nos R, falando cantado. Alguns baianos quando vão prá São Paulo, voltam de propósito com aquele sotaque horrível, se esquecendo que dentre os inúmeros sotaques da língua portuguesa no Brasil, o nosso sotaque baiano é o mais bonito, mais charmoso e mais sexy.
Dentro da casa o forró animado, o Gilvan a dançar atarracado com uma linda morena, quando alguém o falou: “Gilvan, Miúdo ta lá fora”. Ele deixou a morena no meio da sala e saiu em disparada para abraçar o seu ídolo. Chegou perto dele de braços abertos e gritou: Miúduudoooo! Prá sua decepção, Miúdo, inerte, perguntou: “Quem é você? Não estou te reconhecendo, você é filho de quem mesmo?”. “Ah não?” disse o Gilvan, “não ta me reconhecendo não, é?” E deu-lhe uma porrada, aí Miúdo gritou: “Poxa Vanzinho, que brutalidade é essa?
”.
”.
E muitos anos depois...
Aproveitando a visita do Sr. Gilvan à sua terra natal, fomos até o Miúdo, que mora na Fazenda Mangabeira, um povoado perto do Mato Grosso.
Seguindo informações colhidas de sebastianenses da Mangabeira, íamos a caminho da casa do Miúdo. Ao chegarmos no local, perguntamos à uma garotinha que estava na frente da casa se lá era mesmo a casa do Miúdo, ela disse que não mas vimos um senhor descendo a rua, andando com dificuldades, logo o fã reconheceu o ídolo e foi ao seu encontro enquanto a garotinha dizia que aquele que descia a rua era ele e eis que depois de muitos anos, o fã reencontrou seu ídolo.
Gilvan e Miúdo



